Disclaimer: Card Captor Sakura, bem como os seus respectivos personagens, n?o me pertence, e sim ao CLAMP. Eu posto esta fic apenas por divers?o e entretenimento, e sem nenhuma inten??o de lucrar algo com isso.

Esclarecimento: Esta história também n?o é de minha autoria, ela é uma adapta??o do livro de mesmo nome, de Mary Lyons, que foi publicado na série de romances "Julia", da editora Nova Cultural (edi??o 594, publicada no Brasil em 1991).

OBS: Esta adapta??o provavelmente terá OoC. Muito bem, todos foram avisados...


CREP?SCULO VERMELHO

Capítulo 1

Shaoran Li, alto, atraente e um dos mais ricos banqueiros da cidade de Boston, Massachusetts, caminhava despreocupadamente entre a multid?o que perambulava pelo mercado antigo de Aleppo.

Ocasionais raios de Sol penetravam pelas fendas do teto alto e abobadado, iluminando as finas selas de couro, cobertores de pêlo de camelo e imensos tapetes de l? de carneiro, empilhados em grandes quantidades pelas lojas e tendas.

Tendo sido apontado como chefe de uma delega??o do Fundo Monetário Internacional, Shaoran acabava de se parabenizar por ter conseguido escapar, por algum tempo, tanto de seus próprios conselheiros financeiros como da comitiva árabe oficial, quando algo inesperado lhe aconteceu.

Em pé, na entrada de uma loja, admirava uma grande tela negra com moldura de madrepérola quando um violento empurr?o pelas costas o fez cair sobre uma pequena pilha de tapetes.

Atordoado e sem f?lego pelo golpe, Shaoran n?o percebeu de imediato que n?o estava sozinho sobre os tapetes, como julgara a princípio. Era impossível distinguir na massa de tecidos que lhe ocultava a vis?o, mas suas m?os logo descobriram que o objeto sobre seu corpo era quente e humano... e especificamente feminino !

- Oh, perdoe-me...

- Ei ! - a mulher protestou e come?ou a se debater - N?o sei quem você é, mas tire suas m?os de mim, imediatamente ! Seu... seu bruto nojento !

Ele enrijeceu ao reconhecer o acento tipicamente inglês daquela voz.

Tomado por um terrível pressentimento, suas suspeitas foram rapidamente confirmadas quando ele, por fim, conseguiu se libertar do peso que o oprimia.

- Oh, n?o ! N?o posso acreditar ! Você, outra vez ? - ele grunhiu ao fitar a cascata de cabelos castanhos, o rosto afogueado e os imensos olhos verdes estarrecidos.

A viagem de duas semanas a negócios pela Síria fora meticulosamente planejada. Todos os oficiais do Departamento de Estado e também do FMI o instruíram até a exaust?o sobre como proceder diante de toda e qualquer contingência. Apesar de tanto cuidado, o que lhe acontecera ? Mal pusera os pés naquele longínquo país, a m?o inclemente do destino se levantara contra ele ! Por que justamente ele ? Era o que queria saber. O que ele fizera de mal para merecer a persistente e caótica destrui??o de sua vida, representada por aquela inglesa maluca ?

E o fato lastimável, para n?o dizer profundamente irritante, era que a dra. Sakura Kinomoto era bonita demais, o que só piorava as coisas. Sempre tivera o bom senso de n?o misturar negócios com prazer e n?o se deixar envolver por executivas, por mais atraentes que fossem. O que lhe dera, ent?o, para que, cinco minutos após conhecer essa diabólica garota, sofresse uma tempestade cerebral... e a beijasse ? E por que raz?o cada um dos encontros subseqüentes terminara exatamente da mesma maneira ?

Shaoran suspirou profundamente e tentou aclarar as idéias. Parecia que a proximidade do corpo macio e quente de Sakura estava provocando o usual efeito desastroso sobre sua habilidade de raciocinar. Era uma loucura ! Isso nunca lhe acontecera antes em todos os seus trinta e quatro anos de tranqüila existência. A única explica??o que podia fazer algum sentido era que ele estava sofrendo de um delírio mental temporário, e o remédio para aquele mal seria manter a cabe?a fria.

Como ela conseguira formar-se doutora em Medicina era algo além de sua imagina??o. No que se relacionava aos seus pacientes, ela deveria representar o beijo da morte. Isso, é claro, se ainda restasse algum paciente vivo, o que ele duvidava. Por pouco ela n?o o matara em Palmyra, sem contar que quase o afogara na piscina do hotel, em Damasco. O nome daquela mulher deveria ser Encrenca, com "E" maiúsculo ! A verdade é que seria um milagre se ele conseguisse retomar inteiro aos Estados Unidos !


Sakura fitou os olhos cor de ?mbar, frios e implacáveis, o cora??o lhe pesando como uma pedra. Desde o primeiro dia em que pisara na Síria, esse homem persistia em surgir à sua frente, praticamente do nada... como o gênio maldoso de uma garrafa. Fizera o melhor que pudera para se manter afastada de seu caminho, mas onde quer que fosse lá estava ele, t?o grande quanto a vida e duas vezes mais feio !

N?o que ele realmente fosse feio, é claro. De fato, com uma mecha de cabelo espesso e castanho caída sobre o rosto bronzeado, n?o havia dúvida de que esse terrível homem era extraordinariamente bonito. Isso, aliado à acusa??o que ele lhe fizera da última vez em que tivera o azar de encontrá-lo, de que ela estava seguindo-lhe os passos, deixava-a furiosa. N?o tinha a menor idéia da raz?o pela qual ele julgava ser um presente divino às mulheres.

A verdade nua e crua era que desde o primeiro instante em que pusera os olhos sobre aquela figura alta e arrogante, que caminhava pelo hotel em Damasco como se fosse o dono do lugar, ela detestara-o instintivamente.

Além de arrogante, o homem era obviamente maluco.

Qualquer um que tivesse a coragem de agarrar e beijar uma estranha, após alguns minutos de um primeiro encontro, era um potencial candidato ao manic?mio. Nos encontros seguintes, em que ela acabara novamente entre seus bra?os e que fora acusada de persegui??o, n?o lhe restara a menor dúvida de que Shaoran Li era realmente um lunático ! Se ele tivesse um mínimo de bom senso, veria que a culpa n?o era dela de se chocarem a todo instante.

Exceto dessa vez, em que talvez a culpa fosse realmente dela. N?o que ela o tivesse feito de propósito, é claro, mas a imensa pe?a de tecido que ela puxara do alto de uma pilha provara ser muito mais pesada do que ela supunha e, ao se desenrolar, a impedira de ver por onde andava.

Parecia que ela realmente devia desculpas ao homem abominável. Seria difícil dizer alguma coisa, mas...

Sakura soltou uma exclama??o, o sangue aflorando-lhe ao rosto, quando tardiamente percebeu que as m?os que a seguraram com firmeza deslizavam agora lenta e eroticamente pelas curvas de seu corpo. Oh, Deus ! O que ela estava fazendo, que ainda n?o havia levantado de cima dele ? Deveria estar fora de si !

Enquanto estivera ocupada em se livrar dos muitos metros de tecido, a express?o zangada daquele rosto bronzeado se alterara completamente. Os olhos cor de ?mbar transmitiam, agora, uma mensagem diferente, que fez seu cora??o acelerar e a excita??o arrepiar seu corpo. Oh, n?o ! Ele n?o iria beijá-la outra vez !

- Eu... sinto muito - ela murmurou, enquanto rolava para o lado - Foi um acidente..

- ? mesmo ? - Shaoran deu uma risada de zombaria - N?o sei o que fiz para merecer tanta aten??o de sua parte, mas n?o daria para você fazer o favor de parar de me seguir ?

- Eu n?o o estou seguindo ! - ela protestou.

- Mas parece - ele retrucou - Embora a Síria n?o seja t?o pequena assim, a única coisa de que tenho certeza absoluta, aonde quer que eu vá, é que você surgirá a minha frente como uma boneca saltando de dentro de uma caixinha de surpresas.

O corpo esbelto de Sakura estremeceu de raiva enquanto lutava selvagemente para se livrar daquele emaranhado de tecidos.

- Quanta arrog?ncia ! - ela escarneceu - No que me diz respeito, você é a última pessoa no mundo que eu desejaria encontrar.

- Posso lhes ser útil ?

O comerciante árabe os interrompeu, fazendo com que Shaoran se levantasse no mesmo instante e olhasse ao redor.

- Era só o que me faltava ! - ele murmurou, ao notar a pequena multid?o que se formara na entrada da loja, interessada em descobrir o que se passava entre o casal.

Enquanto ela tentava ajeitar a saia e prender os cabelos, Shaoran a pegou pelo bra?o.

- Ei ! O que pensa que está fazendo ? - ela protestou - Se n?o tirar as m?os de cima de mim, eu...

- Cale-se ! - ele grunhiu, sem afrouxar o firme aperto em seu bra?o. Com um sorriso embara?ado, Shaoran colocou algumas notas na m?o do árabe antes de abrir caminho pela multid?o, puxando Sakura atrás de si.

- Solte-me, por favor ! - ela reclamou - E n?o precisa correr tanto ! N?o há ninguém nos perseguindo.

- Como pode saber ? - ele riu, sarcástico - Seremos um prato cheio, caso a imprensa descubra o desastre que aconteceu por aqui. Por medida de seguran?a, n?o a perderei mais de vista até que a devolva ao hotel. Talvez, ent?o, se eu tiver sorte, possa finalmente relaxar.

- Mas... eu n?o quero voltar para o hotel agora - ela gritou, tentando se libertar - Ainda quero fazer algumas compras.

- Que pena ! - ele comentou impiedosamente, enquanto deixavam o ruidoso mercado e emergiam numa das principais vias públicas de Aleppo - Onde você está hospedada ?

Grata pela oportunidade de recuperar o f?lego, Sakura o fitou com uma express?o de rebeldia. N?o permitiria que aquele maluco atrapalhasse seus planos. Ainda n?o conseguira comprar nem a metade das coisas que pretendia, e aquele bairro da parte norte de Aleppo era famoso por seus brocados de seda, exatamente o que sua tia Natsumi adoraria ganhar.

- Ent?o ? - ele insistiu.

- Sabe que é um chato ?

- Posso lhe garantir que sou geralmente considerado um homem bastante razoável, embora nas últimas duas semanas, e certamente pelo restante do período em que serei obrigado a encontrá-la, tenha aprendido a cultivar um certo nível de autopreserva??o ! - ele retrucou, com um sorriso sard?nico - Sugiro que n?o percamos mais tempo, está bem ? Qual o nome do seu hotel ?

- N?o vou dizer... Ai ! - ela pestanejou quando os dedos de Shaoran se cravaram com mais for?a em seu bra?o.

- Está bem. Já que insiste, estou hospedada no Ramsés, mas n?o vou para lá ainda...

- Oh, sim, você vai ! - ele afirmou, enquanto fazia um sinal para um táxi que passava. For?ando-a a entrar no veículo, ele informou ao motorista o nome do hotel e reuniu-se a ela, em seguida.

"Eu o odeio", Sakura pensou, ao procurar se sentar o mais longe possível daquele homem alto e forte. Naquele momento passavam diante do museu arqueológico, onde, no dia anterior, ela admirara, por horas, as antigas estátuas em pedra e bronze, muitas das quais haviam sido escavadas por seu pai.

Por toda a sua vida, Sakura esperara que algum dia pudesse ter a oportunidade de conhecer melhor o pai. O excêntrico professor francês Fujitaka Kinomoto, contudo, estivera sempre t?o ocupado em suas escava??es arqueológicas nas ruínas do deserto de Palmyra que mal tomara conhecimento de sua existência.

Na verdade, ela tentou corrigir o pensamento, n?o estava sendo muito justa com ele. Nunca deixara faltar nada à filha e instruíra sua tia para que cuidasse muito bem de sua educa??o. Entretanto, estava longe de se sentir satisfeita em ver o pai apenas nas raras e breves ocasi?es em que ele visitava Oxford. Isso certamente n?o era uma base consistente para um relacionamento entre um pai e uma filha.

N?o havia dúvida de que Fujitaka Kinomoto n?o fora um homem talhado para o casamento. Como a tia Natsumi salientara, as únicas mulheres que poderiam interessar seu pai deveriam ter no mínimo dois mil anos de idade ! A pobre Nadeshiko nunca conseguira prendê-lo. Nadeshiko Amamiya, contudo, uma garota tímida e calada, a antítese da irm? mais velha Natsumi, apaixonara-se perdidamente pelo jovem estudante francês que viera estudar em Oxford com seu pai, o professor Amamiya. Talvez ele tivesse se envolvido com ela exatamente por causa de sua personalidade tranqüila, ou, talvez, como a tia Natsumi sugerira, por ter se sentido lisonjeado em ser alvo de uma total e silenciosa adora??o.

Qualquer que tenha sido a raz?o, Fujitaka se casou com a garota e logo depois partiu para o Oriente Médio, sem mencionar o endere?o em que poderia ser encontrado, ou quando a esposa poderia ir se reunir a ele.

- Foi uma atitude típica do seu pai - a tia a informara - Um homem bonito e charmoso, mas com a cabe?a em outro planeta. Sua m?e, contudo, nunca deixou de amá-lo. Até o dia de sua morte, n?o permitiu que se dissesse uma palavra contra ele. O estranho é que, na época de seu desaparecimento, ele já deveria saber que a esposa estava esperando um bebê.

Quando Fujitaka finalmente resolveu voltar a Oxford, foi para encontrar a jovem esposa morta, devido a um acidente com um motorista de táxi embriagado. Foi também nessa ocasi?o que descobriu ter uma filha de seis meses, que miraculosamente escapara ilesa do acidente. Decidindo que a irm? de Nadeshiko continuaria cuidando da crian?a, ele a instruiu para batizar a menina com o nome de Sakura, o mesmo, aliás, da faculdade que cursara, e partiu em seguida, mais uma vez.

Com o passar dos anos, a fama e a reputa??o de Fujitaka foram ficando cada vez maiores. Embora n?o pudesse dizer que o "conhecesse", Sakura sentia orgulho de ter um pai t?o importante. Ele, por sua vez, em suas raras visitas à Inglaterra, mostrara-se satisfeito em saber que a filha herdara seu talento acadêmico, formando-se com louvor em História e recebendo o título de doutora, dois anos depois. Ele teria ficado mais satisfeito ainda se soubesse que ela se tornara especialista em História Medieval e optara, como ele, pelo ensino e pesquisa universitários, mas o professor Kinomoto falecera três meses antes, vítima de um ataque cardíaco. Embora Sakura fosse grata ao governo sírio por tê-la convidado a visitar oficialmente sua sepultura, ela desejaria possuir lembran?as mais pessoais do pai do que simplesmente seu nome inscrito numa brilhante placa de bronze no museu de Aleppo...

- Chegamos ! - a voz de Shaoran Li interrompeu abruptamente seus pensamentos e ela percebeu que o táxi estacionara à porta do hotel - N?o posso dizer que foi um prazer conhecê-la, srta. Kinomoto, mas esta foi uma experiência da qual eu certamente n?o me esquecerei - ele comentou, seco, enquanto abria a porta do carro e a ajudava a sair.

- O sentimento é recíproco - ela o fuzilou com os olhos e empurrou a m?o que ele lhe estendia. - Só espero n?o ter o azar de tornar a encontrá-lo.

- Apoiado ! - ele riu - Voltarei amanh? aos Estados Unidos, por isso acho que n?o temos mais com o que nos preocuparmos. Bon Voyage ! - ele acrescentou, antes de se encaminhar novamente para a rua.

- Espero que seu avi?o caia no mar ! - ela gritou para a figura que se afastava, antes de subir, furiosa, os degraus da entrada.

Ao atravessar o vestíbulo, ela estava pensando em lavar e escovar os cabelos antes de voltar ao mercado... é claro que n?o permitiria que Shaoran Li lhe ordenasse o que poderia ou n?o fazer!

- Ah, a senhorita inglesa ! - O gerente do hotel veio-lhe ao encontro com um largo sorriso - Tenho uma mensagem para a senhorita... do ministro do Interior em pessoa - ele se inclinou numa reverência enquanto a conduzia ao seu escritório - Por favor, me perdoe - continuou -, eu n?o tinha a menor idéia... foi um erro lastimável. Entretanto, eu garanti a Sua Excelência que n?o precisaria se preocupar com nada. Providenciamos um verdadeiro banquete, e um carro já foi preparado para levá-la ao Hotel Meridien.

- Acho que n?o estou entendendo - Sakura murmurou, enquanto consultava rapidamente o relógio. Mais da metade da manh? havia se passado e ela estava determinada a concluir as compras, que haviam sido t?o rudemente interrompidas, antes de prosseguir com seus planos de visitar a parte antiga da cidade.

- Ah, prezada senhorita. Parece que Sua Excelência, o ministro Hasan Fayed, ficou sabendo de sua necessidade de transporte para retomar a Damasco. Como ele próprio irá para lá hoje, cordialmente ofereceu-lhe um lugar em sua limusine. Fui informado de que um carro virá apanhá-la em meia hora, e tenho o grato prazer de oferecer-lhes um almo?o, que será servido durante a viagem.

- Mas... mas... - "Todos os meus planos foram por água abaixo", pensou ela, sentindo dificuldade em n?o rir diante das maneiras obsequiosas do gerente. Ele certamente pensava que ela estava encantada com a possibilidade de viajar ao lado de um membro t?o importante do governo. De fato, a oferta de Hasan Fayed fora uma dádiva dos céus. Viajar a longa dist?ncia de volta a Damasco numa limusine com ar-condicionado seria realmente bem melhor do que de ?nibus... algo que ela nem sonhara !

No v?o da Inglaterra para a Síria, via Paris, ela se sentara ao lado de uma garota americana, Chiharu, recém-casada com um francês.

- ? t?o bom ter alguém com quem conversar... ainda n?o aprendi muito bem o idioma francês - ela comentara ao apresentá-la ao marido e ao restante da comitiva de arqueólogos franceses. Todos, naturalmente, conheciam a reputa??o de seu pai e insistiram para que os acompanhasse nas visitas aos locais clássicos de escava??es. Sakura aceitara o convite com prazer e fora apenas no dia anterior, após eles retomarem à Fran?a, que ela come?ou a pensar no problema do retorno a Damasco.

Agora, entretanto, parecia que seu problema havia sido solucionado, e poderia viajar confortavelmente.


Ela recostou-se com um sorriso no veículo luxuoso e foi levada ao hotel, que ficava fora da cidade.

Calorosamente recebida pelo ministro, Sakura n?o tinha o menor pressentimento do choque que o destino lhe reservava ao subir os degraus de mármore do hotel.

Hasan Fayed era um homem de meia-idade, baixo e gordo, que sempre se vestia no estilo ocidental. Um antigo amigo de seu pai, ele fora muito gentil em lhe arranjar a viagem à Síria. O único porém era que ele insistia em se comportar como se estivesse perdido de amores por ela. Sakura se confortava, entretanto, com o pensamento de que estava enganada e que as atitudes do homem eram próprias da educa??o e cortesia árabes. De qualquer forma, n?o constituiria um problema ter de tratar com alguém t?o mais baixo do que ela.

- Estou felicíssimo em vê-la, minha querida Sakura - ele a cumprimentou, enquanto a conduzia para a recep??o do hotel - Os últimos dias foram exaustivos ! ? claro que a Síria necessita da ajuda do Fundo Monetário Internacional para desenvolver os programas com as usinas hidrelétricas, mas a regi?o oriental do meu país é muito árida e sem atrativos. Agora, contudo, que poderei olhar para o seu lindo rosto... - ele acariciou-lhe a m?o.

Mas Sakura n?o o ouvia. Seus olhos arregalados estavam fixos na figura alta, de ombros largos, que estava de costas para ela. Oh, n?o ! N?o podia ser ele !

- Aqui está ela, sr. Li - Hasan Fayed a anunciou - Aqui está a adorável "surpresa" que lhe prometi ! - e virando-se para Sakura: - Saiba que este cavalheiro americano adoraria conhecê-la.

Sakura fitava Shaoran Li estarrecida. Longe de adorar vê-la, ele estava chocado. Era como se, de repente, um peso de duas toneladas tivesse despencado do céu em cima de sua cabe?a. Por um breve momento ele apenas fechou os olhos, em seguida respirou fundo e se aproximou.

- Ah, sr. Li, posso ter o prazer de apresentá-lo a...

- N?o precisa nos apresentar, sr. ministro - Shaoran comentou gentilmente, embora ela percebesse que as m?os dele estavam cerradas e uma veia latejasse em sua têmpora - Já tive o... prazer de travar conhecimento com esta senhorita.

- Sim... sim, nós já nos conhecemos - concordou Sakura, sem se importar com a diplomacia de Shaoran.

Hasan Fayed pareceu n?o notar a atmosfera pesada que envolveu os dois visitantes estrangeiros.

- Passei os dois últimos dias com o sr. Li, mostrando-lhe a represa de Euphrates, em Al-Thawrah, que solucionou os dramáticos problemas de irriga??o sofridos no passado por meu país. O sr. Li está muito impressionado com nossos vários projetos hidrelétricos.

Hasan olhou radiante para Shaoran.

- As palavras amáveis de um banqueiro internacional t?o importante tocaram-me fundo o cora??o - o ministro levou a m?o ao peito num gesto afetado.

- Sim... bem... - Shaoran balbuciou, evidentemente embara?ado pela tendência árabe de exagerar os cumprimentos - Estou encantado em rever a srta. Kinomoto...

A capacidade de mentir daquele homem horrível era ultrajante, pensou Sakura. Sua vontade era chutar-lhe as canelas.

- Entretanto, sr. ministro, se devemos visitar a refinaria de petróleo em Baniyas, seria conveniente que f?ssemos agora.

- Sim, é claro - concordou Hasan, batendo levemente na m?o de Sakura - Temos uma longa viagem à nossa frente, mas, com a companhia desta linda garota, o percurso será bem mais agradável.

Shaoran o fitou, estarrecido.

- Acho que n?o estou entendendo. O senhor está querendo dizer que a srta. Kinomoto irá conosco ?

Se n?o estivesse t?o furiosa, Sakura teria rido do tom de incredulidade e da express?o horrorizada do americano. A constata??o de que, apesar de tê-la despachado no hotel, ele seria obrigado a suportar sua companhia pelo resto do dia o fazia sentir-se doente.

Era melhor que ele fosse se acostumando com a idéia, pensou ela, sarcástica. Ela também n?o estava nem um pouco feliz com a situa??o. Sorriu, entretanto, disposta a tirar o melhor do infeliz acaso.

- Foi t?o amável da parte do sr. Fayed oferecer-me uma carona para Damasco... e é também uma honra poder viajar com uma pessoa t?o importante quanto o sr. Li...

Sakura precisou baixar a cabe?a para disfar?ar a vontade de rir diante do rubor de raiva que se espalhou pelo rosto de Shaoran.

- Sabia que o senhor ficaria entusiasmado em ter esta adorável jovem em nossa companhia - comentou Hasan Fayed, inocentemente - O pai da srta. Kinomoto foi um de meus melhores amigos - ele acariciou-lhe a m?o outra vez - Sua morte foi t?o inesperada ! Estamos fazendo o máximo para que ela se sinta bem em nosso país.

- Oh, sim, tenho certeza disso - Shaoran murmurou, e Sakura enrubesceu ao notar o tom sarcástico de sua voz e o olhar cínico que ele deu à sua m?o, firmemente apertada pela do ministro.

- Ah, vejo que nossa nova intérprete já chegou - Hasan acenou a um grupo de pessoas no hall - O pobre Yukito sentiu-se mal à noite e n?o poderá nos acompanhar, mas estou certo de que sua substituta, a srta. Ranya Kashif, é muito competente - ele beijou rapidamente a m?o de Sakura. Desculpem-me por um instante. Preciso dar uma palavra com os outros membros de nossa comitiva, e em seguida nós partiremos, está bem ?

Shaoran esperou até que o ministro se afastasse.

- Muito bem, Srta. Onipresente ! N?o sei o que você está pretendendo, mas...

- N?o estou pretendendo nada, seu idiota ! - ela praguejou - O ministro me ofereceu uma carona completamente inesperada e, quando aceitei, n?o podia imaginar que você viria junto com o "pacote". Se eu soubesse, teria recusado, creia-me.

Ele deu uma risada sarcástica.

- ? mesmo ? Pois me pareceu que você e Hasan Fayed n?o desperdi?ariam esta chance de estarem juntos.

- Para alguém que é considerado uma sumidade no mundo dos negócios, você raciocina com absoluta falta de lógica.

- Do que está falando ? - ele indagou.

Sakura suspirou. Fazia muito calor. Fora acordada de madrugada, por engano, pelo servi?o de despertador do hotel. Aquele homem irritante a impedira de fazer suas compras e agora teria de suportar sua presen?a pelo resto do dia. O dia realmente n?o lhe fora favorável !

- Está bem, sr. Li. Vamos come?ar do princípio. Em primeiro lugar, o senhor parece acreditar que eu planejei esta viagem simplesmente por n?o poder resistir à sua fascinante personalidade ! Por outro lado, o senhor também parece acreditar que eu estou envolvida amorosamente com o ministro. N?o acha ilógico ? - ela acrescentou com sarcasmo - Em segundo lugar, fui oficialmente convidada a visitar este país, onde meu pai está sepultado. Estou certa de que n?o há necessidade de lembrá-lo de que a Síria n?o é um país muito tranqüilo, especialmente para uma mulher solteira, e o fato de eu possuir um passaporte brit?nico n?o ajuda muito. Desde o incidente terrorista em Londres, as rela??es diplomáticas entre a Gr?-Bretanha e a Síria est?o muito prejudicadas. Se algo der errado nesta viagem, eu me verei numa posi??o muito delicada - ela sorriu friamente - Está conseguindo acompanhar meu raciocínio até agora ?

- Sim ! - ele murmurou entredentes.

- ?timo ! O terceiro ponto é uma conseqüência do segundo. ? claro que, para entrar no país e sair s? e salva, eu preciso de ajuda e prote??o. Por isso, longe de estar romanticamente interessada no ministro, ou no senhor, sr. Li, e neste caso eu preferiria me matar, eu estou simplesmente aceitando uma carona de volta a Damasco. Satisfeito ?

Com as fei??es contraídas de raiva, Shaoran foi impedido de responder devido à aproxima??o de um de seus assistentes.

- O ministro está pronto para partir, senhor - o jovem informou, enquanto olhava nervosamente para o chefe e a linda jovem de cabelos castanhos, que pareciam esperar apenas o soar do gongo para dar início a uma luta corporal.

- Estarei pronto em um minuto ! - respondeu Shaoran, seco.

- Bem... o problema é que... o ministro decidiu que eu, mais alguns homens do Ministério e os guardas de seguran?a viajaremos no primeiro carro, que partirá imediatamente. O senhor, a srta. Kinomoto e a nova intérprete viajar?o com o ministro na limusine, que só partirá daqui a quinze minutos - o jovem franziu a testa e sacudiu a cabe?a - Quero dizer-lhe, sr. Li, que n?o acho certo todos os guardas armados viajarem no mesmo carro, nem o fato dos carros seguirem t?o separados.

Shaoran deu de ombros.

- N?o vejo problema algum nisso.

- Eu ouvi rumores, senhor - insistiu o assistente - , de que a cúpula governamental foi avisada para se manter alerta sobre várias fac??es terroristas e...

- A política interna deste país n?o me diz respeito - ele o interrompeu - Estamos aqui estritamente a negócios e, já que o ministro está organizando a viagem, é melhor nós n?o interferirmos.

Ao sentir o olhar glacial de Shaoran sobre si, Sakura n?o teve dúvida de que ele a poria para fora do carro do ministro, se tivesse oportunidade.

Mas o que isso importava ? Gra?as à velha amizade de seu pai com Hasan Fayed, ela viajaria para Damasco com estilo e conforto. E se aquele chauvinista banqueiro americano, Shaoran Li, n?o estava gostando, bem, pior para ele !


P. S.: Nos vemos no Capítulo 2.